Artigo original
Escleroterapia como modalidade de tratamento do lago venoso oral: protocolo de uso
Sclerotherapy as a treatment modality for oral venous lake: protocol of use
Escleroterapia como modalidade de tratamento do lago venoso oral: protocolo de uso
Surgical & Cosmetic Dermatology, vol. 12, núm. 4, pp. 342-345, 2020
Sociedade Brasileira de Dermatologia
Recepção: 07 Agosto 2020
Aprovação: 02 Novembro 2020
RESUMO
Introdução: o lago venoso é uma ectasia venosa que ocorre geralmente nos lábios e na mucosa oral de idosos. Embora a escleroterapia seja um dos tratamentos mais indicados para esta condição, esta técnica é pouco utilizada entre os dermatologistas. Além disso, a concentração do agente esclerosante, a dose e o modo de aplicação não estão padronizados.
Objetivos: relatar o uso do oleato de etanolamina a 5% (OE5%) como agente esclerosante para o tratamento do lago venoso oral e sugerir um protocolo de escleroterapia.
Métodos: foi utilizado em dez pacientes consecutivos um protocolo padronizado para tratamento de lago venoso oral, baseado na experiência de um Ambulatório Universitário de Dermatologia, especializado em Estomatologia. Aplicou-se o OE5%, em injeções intralesionais profundas e centrais, com volume predeterminado, proporcional às dimensões da lesão.
Resultados: seis pacientes tiveram regressão total da lesão com uma sessão. Outros três pacientes alcançaram regressão satisfatória com duas sessões mensais e uma paciente necessitou de três sessões mensais. Todos os participantes relataram edema ou queimação por um a três dias.
Conclusão: o tratamento do lago venoso oral com OE5% é uma técnica segura e eficaz que pode ser usada na prática clínica do dermatologista.
Palavras-chave: Escleroterapia+ Lago Venoso+ Oleato de Etanolamina.
ABSTRACT
Introduction: The venous lake is a venous ectasia that usually occurs on the lips and oral mucosa of the elderly. Although sclerotherapy is one of the most suitable treatments for this condition, dermatologists don't use this technique very often. Also, the concentration of the sclerosing agent, dose, and method of application are not standardized.
Objectives: This study aims to report the use of ethanolamine oleate 5% (EO5%) as a sclerosing agent to treat the oral venous lake and suggest a sclerotherapy protocol.
Methods: We used a standardized protocol to treat an oral venous lake in ten consecutive patients, based on the experience of a University Dermatology Clinic, specialized in Stomatology. EO5% was applied in deep and central intralesional injections, with a predetermined volume proportional to the lesion’s dimensions. Results: Six patients had total lesion regression with one session. Another three patients achieved satisfactory regression with two monthly sessions, and one patient required three monthly sessions. All participants reported edema or burning for one to three days.
Conclusion: The oral venous lake treatment with EO5% is a safe and effective technique that can be used in the dermatologist's clinical practice.
Keywords: Venous Lake, Ethanolamine Oleate.
INTRODUÇÃO
O lago venoso é uma ectasia venosa que aparece principalmente no lábio inferior, mas pode ocorrer também na mucosa oral, sendo mais frequente no idoso.1 É geralmente assintomático, de tamanho variável, e pode cursar com comprometimento estético ou sangramento após trauma local.1,2
A escleroterapia é uma técnica conservadora que consiste na injeção intralesional de agentes esclerosantes que levam à inflamação dos vasos seguida de oclusão e esclerose vascular, resultando em regressão da lesão.2, 3
Embora a escleroterapia seja um tratamento acessível, eficaz e com baixo risco de complicações, a concentração do agente esclerosante, a dose e o modo de aplicação não são completamente padronizados no tratamento do lago venoso.4,5
O objetivo do presente artigo é relatar o uso de oleato de etanolamina a 5% (OE5%) como agente esclerosante para o tratamento do lago venoso oral, tanto do lábio quanto da mucosa oral, e sugerir um protocolo de escleroterapia baseado na experiência do nosso serviço.
MÉTODOS
Descrevemos a seguir o protocolo de tratamento para lago venoso oral que utiliza OE5% como agente esclerosante (Ethamolin®, Farmoquímica - Brasil). A técnica foi utilizada em 10 pacientes consecutivos no atendimento do Ambulatório de Estomatologia do Departamento de Dermatologia da UNIFESP durante o ano de 2019 (Quadro 1).
O procedimento é contraindicado na gestação, em diabéticos não controlados e na vigência de infecção no sítio de aplicação.2-3
RESULTADOS
A maioria dos pacientes era do sexo feminino (7/10) e idade maior de 50 anos (9/10). O lago venoso foi observado no lábio inferior em 6/10 pacientes, no lábio superior em 1/10 paciente e em 3/10, na mucosa oral, com tamanho que variava entre 3 a 10mm de diâmetro. Os pacientes relataram serem lesões assintomáticas com tempo de aparecimento maior de cinco anos. Alguns indivíduos referiram trauma local acidental com sangramento discreto.
Para a maioria dos pacientes foi necessária apenas uma aplicação de OE5% (6/10) (Figura 1). Outros três pacientes alcançaram regressão satisfatória com duas sessões mensais e uma paciente necessitou de três sessões mensais (Tabela 1). A regressão completa das lesões foi observada na grande maioria dos casos (9/10), sendo que, em um caso, a paciente ficou satisfeita com a regressão apenas parcial.
Todos os pacientes relataram desconforto após a aplicação do agente esclerosante, como dor, edema, vermelhidão e/ ou queimação, que duraram de um a três dias (Figura 2). Em um caso, ocorreu ulceração e necrose locais devido ao fato de a aplicação ter sido mais superficial, com resolução em sete a 10 dias sem deixar cicatrizes (Figura 3).
DISCUSSÃO
O diagnóstico do lago venoso oral é baseado nas características clínicas e na história da lesão. Vitropressão, dermatoscopia com luz polarizada, aspiração e exames de imagem também podem constituir recursos acessórios para o diagnóstico e o planejamento do tratamento em alguns casos.3,6,8




Histologicamente, podem ser observadas vênulas irregulares dilatadas de paredes finas localizadas próximas ao tecido epitelial. O diagnóstico diferencial inclui nevo melanocítico, mácula melanótica, melanoma maligno, granuloma piogênico e sarcoma de Kaposi.2,4,6
As modalidades de tratamento do lago venoso incluem eletrocoagulação, excisão cirúrgica, laserterapia, coagulação por infravermelho, crioterapia e escleroterapia.5-8 O OE5% é um dos agentes esclerosantes mais utilizados no tratamento das lesões vasculares e o mesmo é descrito na literatura como um método seguro e eficaz em lesões situadas em diversas regiões do corpo.7-10

Em nosso Serviço, utilizamos a escleroterapia para o tratamento do lago venoso oral há mais de 10 anos com bons resultados. Apresentamos 10 pacientes atendidos consecutivamente e que alcançaram resolução completa em 90% dos casos. Sugerimos este protocolo que pode orientar na definição da quantidade necessária do medicamento em relação ao tamanho da lesão. A aplicação é feita no ambulatório, não sendo necessário o uso do centro cirúrgico. A técnica é rápida e não necessita de bloqueio anestésico. O evento adverso mais incômodo foi o edema temporário após aplicação que costuma ocorrer em todos os casos, o que é facilmente explicado considerando-se o processo inflamatório causado pelo agente esclerosante.
A complicação mais observada foi o surgimento de ulceração devido à aplicação muito superficial, que ocorreu também em alguns casos ao longo da nossa experiência. A resolução ocorreu em 15 dias sem deixar cicatriz. A técnica de injeção deve ser profunda, no centro da lesão vascular para evitar esta complicação. Além disso, o uso de volume do agente esclerosante maior do que o preconizado ou o extravasamento deste pode causar ulceração.
A dose do OE5% limite recomendada para a escleroterapia é de até 2ml por aplicação.
Outras complicações relatadas na literatura incluem casos de hemoglobinúria e insuficiência renal hemolítica, mas tal ocorrência limitou-se ao uso de doses superiores a 9,6ml de OE5%.8,10
A descrição deste protocolo visa a compartilhar a experiência dos autores e as melhores práticas acumuladas nos últimos 10 anos em um Serviço especializado de Estomatologia. O protocolo poderá ajudar os profissionais a maximizar as chances de sucesso e minimizar o surgimento de eventos adversos no tratamento do lago venoso oral.
CONCLUSÃO
O tratamento do lago venoso oral com OE5% é uma técnica segura e eficaz que pode ser usada na prática clínica do dermatologista.
REFERÊNCIAS
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Notas
Autor notes
Dalva Regina Neto Pimentel Concepção e planejamento do estudo; elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Rafael Tomaz Gomes Elaboração e redação do manuscrito; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica da literatura; revisão crítica do manuscrito.
Cleonice Hirata Concepção e planejamento do estudo; obtenção, análise e interpretação dos dados; revisão crítica do manuscrito.
Correspondência: Rafael Tomaz Departamento de Dermatologia – Setor de Estomatologia Escola Paulista de Medicina (Universidade Federal de São Paulo) R. Borges Lagoa, 612 Vila Clementino 04038-000 São Paulo (SP) E-mail: gomes_rt@yahoo.com
Declaração de interesses